Lições de Larrain

Dia desses a Melissa Gibin veio falar aqui na escola sobre Fotografia, Memória e Legado. Foi um encontro excelente.

E inevitavelmente curadoria é um assunto que permeia esse ambiente de debate em artes, fotografia, comunicação.

No meio da palestra ela leu o texto abaixo como ilustração/inspiração para o assunto. O texto foi extraído de uma carta, uma aula. Em carta, o fotógrafo Sérgio Larraín (1931-2012) ensina ao seu sobrinho em 1982, Sebástian Donoso Larraín, os segredos de sua arte (in Revista Zum, nº5), leia:

Cole com durex na parede, faça cópias em folhas de tamanho postal e olhe para elas.

Comece a brincar com os ângulos, testar cores, enquadrar e vá aprendendo composição, geometria, enquadre perfeitamente, usando os ângulos.

E amplie o que enquadrou, e deixe na parede assim. Para ir observando. Vá olhando. Quando tiver certeza de que uma foto é ruim, para lata do lixo!

Na mesma hora. E a melhor você sobe um pouco mais na parede; no final, guarde as boas, e só. Guardar o medíocre faz você estancar no medíocre.

É o top, e nada mais, o que se guarda. Jogue o resto fora, porque a gente carrega na psique tudo o que conserva.

Depois faça ginástica, distraia-se com outras coisas e não se preocupe mais. (…)

E vá juntando poesia, a sua e dos outros, pegue tudo o que encontrar de bom nos outros.

E faça uma coleção de coisas ótimas, um museuzinho numa pasta. Siga o seu gosto e mais nada, acredite no seu gosto. Você é a vida, e a vida é a que você escolhe. O que não gosta, não veja, não serve.

Você é o único critério, mas veja as coisas de todo mundo. Vá aprendendo… Quando tiver algumas fotos realmente boas, amplie e faça uma pequena exposição – ou um livrinho. Mande encadernar.

E, com isso, vá firmando um chão. Ao mostrá-las, você se dá conta do que são, ao vê-las diante – é aí que você as sente. Fazer uma exposição é dar algo, é dar de comer, é bom para os outros mostrar-lhes algo com trabalho e gosto. Não é se exibir, faça bem-feito, é saudável para todos. E para você faz bem, porque você vai se testando.

Meditando mais no texto tirei algumas lições simples:

1) é preciso ter método. As fotos nas peredes… subindo conforme elas são “eleitas”… jogar fora com critério… um museuzinho numa pasta…

2) é preciso assumir o controle (no que for possível) das suas influências: veja as coisas de todo mundo, mas mantenha o sonso crítico.

3) é preciso lutar (não só aspirar) pela sua identidade: siga seu gosto… acredite no seu gosto… você é o único critério. (Eu, pessoalmente não diria “único critério”, mas… é um critério importante.)

4) é preciso lutar contra a mediocridade, que tem grande poder: Guardar o medíocre faz você estancar no medíocre.

5) é preciso deixar o tempo agir, ele é parte fundamental da curadoria: E vá juntando poesia… quando tiver algumas fotos realmente boas… vá aprendendo…

6) expor seu trabalho é um ato de amor, é para os outros: Fazer uma exposição é dar algo, é dar de comer, é bom para os outros mostrar-lhes algo com trabalho e gosto. Não é se exibir, faça bem-feito, é saudável para todos.

7) o trabalho precisa condensar, engrossar, como um molho de tomate: Quando tiver algumas fotos realmente boas, amplie e faça uma pequena exposição – ou um livrinho. Mande encadernar. E, com isso, vá firmando um chão…

Essa é uma carta que eu vou passar a ler para meus alunos, assim eu a releio também. Sei que surgirão outras lições, outras camadas… espero que seja assim pra você também.

CHARBEL CHAVES
CHARBEL CHAVES

Fotógrafo e Professor de Fotografia desde 2010. Desenvolve trabalhos autorais, comerciais e educacionais simultaneamente. Autor do livro "Jornada: As histórias que as fotografias contam"

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